A Conquista da Honra, por Nicholas Mello

A Conquista da Honra (2006) (Flags of Our Fathers)

Por Nicholas Mello


DIREÇÃO: Clint Eastwood
ELENCO: Ryan Phillippe, Jesse Bradford, Adam Beach, Barry Pepper, Paul Walker, Jamie Bell, John Benjamin Hickey
ROTEIRO: William Broyles Jr., Paul Haggis, baseado no livro de James Bradley e Ron Powers
PRODUÇÃO: Clint Eastwood, Steven Spielberg, Robert Lorenz
MÚSICA: Clint Eastwood
FOTOGRAFIA: Tom Stern
MONTAGEM: Joel Cox, Gary D. Roach
DIREÇÃO DE ARTE: James J. Murakami

Nota: 7.5

Livros, peças de teatro, histórias em quadrinhos e até mesmo páginas de jornais já serviram de base para diversos filmes, porém, com "Flags of Our Fathers", o diretor Clint Eastwood se propõe, não sem alguma ousadia, a desenvolvedor todo um filme a partir de uma única fotografia, talvez a mais famosa de todas: a "Raising the Flag on Iwo Jima", tirada durante a Batalha de Iwo Jima.

O fotógrafo Joe Rosenthal só conseguiu aquele enquadramento marcante por acaso. A primeira bandeira - sim, foram duas - hasteada no Monte Suribachi foi retirada e levada para um político como um suvenir de guerra, ao passo que a segunda, bem maior, foi colocada no mastro e erguida pelos fuzileiros americanos numa posição ensaiada pelo próprio Rosenthal, que tirou a foto rapidamente, sem dar muito valor. Bastaram algumas semanas, e essa imagem, que foi impressa nos jornais, ganhou a simpatia dos próprios americanos, que passaram a apoiar mais o país na guerra no Pacífico, inclusive financeiramente.

Mais do que mostrar, sem romantismo, como a icônica foto foi tirada, Eastwood também se detém na sangrenta Batalha de Iwo Jima, através da perspetiva dos americanos - a visão dos japoneses seria explorada em "Letters from Iwo Jima", uma espécie de filme irmão de "Flags of Our Fathers" -, além de acompanhar três, dos seis homens presentes na foto, na sua ida aos EUA para serem louvados como heróis e fazerem uma campanha atravessando o país para levantar fundos.

Eles são John "Doc" Bradley (Ryan Phillippe), Rene Gagnon (Jesse Bradford) e Ira Hayes (Adam Beach), sendo este o melhor desenvolvido pelo filme, um descendente de nativos americanos que rejeita tal glorificação fruto de algo falso. Ele chora, embebeda-se e tenta sempre contar a verdade sobre aquela bandeira sendo hasteada. Para além da discriminação que um indígena americano por si só já sofreria nesta época, essas atitudes de Hayes só aumentam a hostilidade em relação à sua pessoa e demonstram o quão intolerante um país como os EUA pode ser. Roger Ebert foi certeiro ao afirmar, em sua critica, que a América queria que Hayes fosse um herói, mas não um americano. Gagnon, aproveita-se de sua fama para construir relações com políticos, além de se casar com uma de suas namoradinhas que estava determinada a tê-lo como marido, ao passo que Bradley entende e aceita sua função de garoto-propaganda do governo, indo de cidade em cidade sempre a repetir mesma coisa: "os heróis verdadeiros são aqueles que deixamos para trás". É este quem está na primeira cena do filme, um veterano já idoso, assombrado pelos horrores da guerra, que perde o sono ao ouvir os gritos dos companheiros que padeceram no campo de batalha.

Dave Severance (Harve Presnell), comandante das forças americanas em Iwo Jima, em entrevista para o filho de Bradley, que está escrevendo um livro sobre o tema, reflete: "Gostamos das coisas bem simples, o bem e o mal, os heróis e os vilões. Sempre há muitos de cada lado. Na maioria das vezes, eles não são o que pensamos que são. A maioria das pessoas que eu conheço nunca falaria sobre o que houve lá. Provavelmente porque ainda tentam esquecer aquilo. Certamente eles não se achavam heróis". Invariavelmente, essa é a visão dos veteranos: uma tendência de não ver heroísmo em suas ações. O tom melancólico que Eastwood dá à "Flags of Our Fathers", aliado à fotografia fria e seca de Tom Stern, ajuda a conduzir o filme justamente num sentido de desencantamento em relação à guerra.

Ao final, chegamos à conclusão de que alguns atos de heroísmo podem ser fruto de uma construção artificial, mas os heróis, não; estes, valorizados ou não, jamais chegam a ser compreendidos e justamente por isso representam, com todas as suas contradições, aquilo que de mais puro e louvável que há na humanidade.

"Flags of Our Fathers" não é perfeito. Nos seus vai e vem no tempo, vez ou outra, a fluidez narrativa é perdida; mas não há como deixar de observar que só um diretor com uma visão de mundo muito sensível seria capaz de abordar a guerra com todas as sutilezas que vemos em tela. Esse diretor é Clint Eastwood, um verdadeiro artista.

Capa do Filme



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